A celebrada série House of Cards (Netflix) tornou-se bem famosa, entre outras coisas, pela verborragia e frases impactantes de um dos protagonistas, Frank Underwood. Mas é no silêncio que podemos tirar a maior lição de liderança em House of Cards. Principalmente no silêncio triunfal da outra protagonista, Claire Underwood.
“Tudo neste mundo tem o seu tempo; cada coisa tem a sua ocasião . . . tempo de ficar calado e tempo de falar.”
Poderíamos dizer que o Rei Salomão escreveu esses versos pensando em Claire Underwood. Ou então poderíamos dizer que ela leu esses versos e decidiu aplicá-los muito bem. Ao longo de todas as seis temporadas de House of Cards, Claire se desliza em silêncio, mas quando abre a boca para falar consegue atingir grandes resultados.
Embora o silêncio possa ser muito bem usado, para o bom, ele também pode ser muito mal usado, para o mau. Vamos ver, a seguir, como Claire Underwood fez isso.
O que você vai encontrar aqui:
Claire usa o silêncio para o bem
No capítulo 38 (T3E12), numa visita de campanha, Claire visita uma simples dona de casa do Iowa, com um bebê no colo, que nem votaria em seu marido, e candidato, Frank Underwood. Ela pede para entrar, achando que pode convencê-la a mudar de opinião sobre o voto. Começa a ouvir dessa mulher um relato das mulheres humanas e mortais. Primeiro, que tinham votos divergentes. escuta sobre uma grande lista de murmurações maternais: fadiga, exaustão, solidão, mas a liberdade de, naquela vidinha, provavelmente possuir mais liberdade que Claire. Ela também ouve sobre os desgostos que aquela mulher sente em momentos delicados, quando fantasia usar uma almofada para asfixiar o bebê e fugir correndo daquele casamento e daquela maternidade tão desejada.
Claire ouve tudo em silêncio atencioso! Tanto é que a mulher diz a Claire: “Você sabe mesmo ouvir. Queria que você tivesse se candidatado a presidente. Pode dizer a eles que vou apoiar seu marido, se quiser.” A senhora Underwood sai da casa completamente atônita. Perguntada pela imprensa, ao sair da casa, se a mulher mudou de ideia, Claire responde que “não, ela ficou firme. Mas não se pode culpar uma mulher por ter convicções.”
Como o líder excelente usa o silêncio para o bem
Algumas pessoas têm dificuldade em não falar e acostumam-se a explicar demais. Mas o silêncio é um bem muito precioso porque nos permite parar e pensar antes de agir ou falar. O o silêncio produtivo nos ajuda a pensar e a refletir, nos ajuda a entender o ambiente e a criar chance de interlocução.
Se soubermos ouvir em silêncio, prestando atenção sem interromper, conseguiremos nos concentrar no que o outro diz e a elaborar a resposta depois. Quando falamos sem parar, sem fazer pausas, isso dificulta a interação do outro na conversa.
O líder não pode responder sem pensar, mesmo que fique literalmente parado, sem falar nada, por vários segundos, ou até mais de um minuto. Pensar e refletir em silêncio, antes de responder, é essencial para falar algo que faça a diferença.
Ao aprender a lidar com o silêncio, o líder excelente obtém diversos ganhos:
- Aprende a escutar, que é o primeiro passo para demonstrar empatia.
- Consegue analisar a situação como um todo, tendo uma super visão de um horizonte mais amplo.
- Quando o líder está em silêncio, ele consegue ouvir o que não é dito, ou seja, as expressões faciais e postura corporal do outro e fortalece sua presença.
- O silêncio reforça a intuição, ajudando a tomar decisões com sabedoria, não apenas baseadas em fatores como a lógica e a razão.
- Aprende a poupar energia, sim, com foco no que interessa e não gastando palavras com o que não merece séria consideração.
Claire usa o silêncio para o mal
A partir daquela visita, Claire começará a questionar tudo, se vale a pena tudo que tem feito, todas as renúncias (de nunca ter sido mãe, por exemplo). A partir dali, Claire definitivamente não será a mesma. Deixa de comparecer aos importantes compromissos de campanha do marido, ao discurso de vitória no Iowa, não atende as ligações renitentes de Frank, que naquela situação pensa apenas em votos.
E quando Frank volta sozinho da vitória no Iowa, tem o esperado embate, em verdadeira explosão, ambos dizem coisas que estavam guardadas pelo silêncio. Francis usa palavras duras e dá ordens expressas sobre o que Claire deverá fazer no dia seguinte: ‘pegar o avião e viajar a New Hampshire, fazer campanha, estar com ele no palco, comportar-se como primeira-dama’. Claire responde apenas com um profundo silêncio. Mas não se engane: o ensurdecedor silêncio externo dela nada mais é que o reflexo interno de um ego extremamente exaltado, recheado de poderosa – e falsa – indiferença que só serve para manipular. E é isso que ela faz no dia seguinte quando, no pleno controle da situação, se apronta totalmente dando sinais silenciosos de que viajará, e na hora derradeira vira-se ao marido e diz: “Não vou a New Hampshire…Vou deixar você” e parte, silenciosamente.
Alguns começaram a assistir House of Cards achando que o verborrágico personagem Frank Underwood era o protagonista (o único). Achavam também que era o mais poderoso (o único). Alguns sentiam mais confiança em Frank, talvez porque ele sempre tenha deixado muito claro seu objetivo, falando com o público, compartilhando suas intenções. Mas parece que estavam todos enganados, inclusive o próprio Frank.
Ao que tudo indica, Claire Underwood estava no controle desde o início, em silêncio. Mesmo quando teve de renunciar a várias coisas pelo marido, ainda mantinha-se em controle exatamente por utilizar bem o silêncio. Ao longo das temporadas, presenciamos aquela que era apenas esposa do corregedor da Câmara chegar à presidência definitiva dos EUA. Como o próprio Frank reconheceu, “não haveria Casa Branca sem a Claire”. A senhora Underwood chegou ao comando da nação americana usando seu poderoso e silencioso armamento, quando necessário, contra todos, especialmente contra seu marido. Isso é doloroso para Frank, assim como é doloroso para quem passou vários anos assistindo a série torcendo por ele em detrimento da senhora Underwood. No final, Claire manipulou silenciosamente a todos e isso é compreensivelmente doloroso.
O líder excelente não usa o silêncio para o mal
O silêncio maldoso é usado como forma de manipulação ou vingança, ou mesmo para demonstrar indiferença, como se estivesse sem emoções e quisesse demonstrar que não se importa. Também é usado para ocultar as verdadeiras intenções, como Claire fezno exemplo acima.
O líder excelente jamais deve usar dessas táticas, e jamais deve usar o “tratamento de silêncio”, ou seja, ficar um tempo ignorando o seu liderado, ou até mesmo ignorando sua presença.
A lição é tão simples quanto isso.
O líder excelente presta atenção ao silêncio da equipe
Quando o líder percebe que o time não está querendo se manifestar, por exemplo, numa reunião… o que fazer?
O primeiro passo é refletir, em silêncio, qual seu grau de responsabilidade nesse silêncio defensivo do time. Em alguns casos, pode ser que algumas atitudes e comportamentos do líder estejam contribuindo para inibir o time. Alguns chegam a usar expressões do tipo: “Eu não vou falar, não adianta“. ” Pra quê falar, não vai servir pra nada, só desgasta...”
Se o líder fala demais, não passa a palavra a todos, se toma decisões sozinho, ou com apenas alguns do grupo, se não sabe fazer perguntas com habilidade… atitudes como essas contribuem para desestimular o time e deixar a todos inseguros.
Um líder não pode ser vaidoso, nem apontador de erros. Uma mudança simples e que pode ajudar o time a se expressar é se incluir quando falar algo (especialmente quando for um erro). Trocar a palavra “EU” por “NÓS” faz uma grande diferença.
Se o líder é muito rápido em construir críticas sobre seus liderados, e não aprendeu a elogiar, isso com certeza contribuirá para que o time fique em silêncio. E aqui estamos falando do silêncio negativo, daquele que está carregado de insegurança e medo, e que não contribui em nada para resultados positivos.
Quem dá o tom é a liderança. Então, como líder, questione-se:
- Encorajo os meus liderados a discordar de mim, isto é, a expressar pontos de vista diferentes?
- Reconheço a coragem da discordância, quando observo em um liderado?
- Sou capaz de questionar minhas próprias decisões passadas, para mostrar aos meus liderados que a análise crítica e construtiva faz parte do processo de melhoria e desenvolvimento?
Conclusão
Há muitas cenas em House of Cards que expressam o poder do silêncio, em contextos positivos e negativos. Claire é a maior especialista em usá-lo, mas Frank Underwood também o utiliza com habilidade. É uma série excelente, e vale a pena ser vista e revista.
Que este artigo o ajude a aprender (ou a reforçar) a importância do silêncio e, principalmente, de usá-lo com habilidade e maestria.
Meu nome é Ninguém. Minha história esqueci. Minha idade é o agora. O passado eu perdi. Eu venho do nunca, eu venho do nada. Não tenho destino, não tenho parada.