Steve Jobs possui uma legião de fãs, ao mesmo tempo que acumula uma multidão de desafetos. As opiniões são quase sempre extremas em relação a ele, seja para enaltecê-lo ou para desmistificá-lo. Uma das dúvidas mais cruciais que pairam sobre Jobs é se ele foi um líder, ou se foi apenas um chefe. Buscar o equilíbrio é fundamental para entendermos quem realmente foi essa figura. A vida de Jobs é contada em vários filmes, pois ninguém cansa de escrever sobre ele, nem de fazer documentários e filmes sobre ele. Vamos analisar alguns e descobrir como Steve Jobs agiu como líder e como chefe, analisando 6 características de seu estilo como administrador.
Antes de tudo, vamos entender a diferença entre chefia e liderança. Há várias tentativas de explicar essa diferença. Com isso, surgem duas perguntas: é possível ser um chefe sem ser um líder? É possível ser um líder sem ser um chefe? Se fossemos resumir, poderíamos dizer que o chefe manda e o líder inspira. Ou seja, ser um chefe tem a ver com o seu cargo hierárquico. Ser (ou não ser) um líder tem a ver com a forma com que exerce sua função hierárquica. Nem todo líder é um chefe, mas todo chefe deveria ser um líder.
Há muito ruído na interpretação desses dois papeis e muita tentativa de demonizar a figura do chefe. O líder excelente aplica o equilíbrio das duas funções. Ou seja, é possível ser um líder (inspirar pessoas) mesmo ser ter um cargo de chefia (autoridade hierárquica). De fato, também é possível ser um líder excelente numa posição de autoridade. Portanto, precisamos parar de espalhar a falácia de que um bom líder não precisa agir como chefe em algumas situações. E vamos observar como Steve Jobs fez isso.
O que você vai encontrar aqui:
Vamos discorrer sobre as 6 maneiras em que Jobs exerceu chefia e liderança:
Será incrível perceber como Steve Jobs foi realmente um péssimo chefe, ao mesmo tempo que era um líder excelente. Parece impossível, mas ele de fato conseguiu.
- Coercitivo
- Treinador
- Modelador
- Democrático
- Dirigente
- Afetivo
Leia também: Como se tornar um líder excelente assistindo Duna (2021)
Steve Jobs era um chefe coercitivo
Steve Jobs vivia fazendo duras críticas ao trabalho de seus funcionários. Isso é péssimo, pois provoca uma legião de demônios internos, conhecidos como ansiedade, fúria, insegurança, medo, stress, e vários outros.
No filme Piratas do Vale do Silício (1999) notamos os seguintes diálogos:
— Pedi algo brilhante!
— Steve
— Pedi genialidade e você me entrega isso?!
— Steve, por favor…
Além de criticar o trabalho de um membro do time, Jobs apela para a violência, puxando o cabo do computador. Patético! Uma hora essa violência se volta para ele.
— Não Steve, de novo não. São 3h da manhã e não tenho mais energia para defender um desenho inacabado.
— Isso porque não há nada pra defender. Eu quero beleza, não incompetência. Você está ouvindo?
— Sim, eu estou ouvindo … [partindo para agressão física] … estou farto dos seus abusos, é só isso que você sabe fazer, arrasar as pessoas, provocar ressentimentos, seu desgraçado miserável…]
Steve Jobs foi um líder treinador
Acompanhe o seguinte diálogo (do filme Jobs (2013):
— Como está indo?
— Tem que ser reto, tem que ser mais simétrico.
— Temos 60 dias para fazer 50 dessas e tá preocupado com a simetria? Steve, ninguém se importa com a aparência da placa.
— Eu me importo.
— Ah, que ótimo. Mas nosso tempo acabou assim que você fez essa promessa absurda.
— Tem razão, precisamos de ajuda.
Aqui o Jobs agiu como um líder, embora também estivesse na posição de chefe. Como chefe e líder, Jobs foi acompanhar o desenvolvimento de um projeto. O líder Jobs treinou, de forma simples, instruiu como o projeto final deveria ficar. Como chefe, Jobs comando ao determinar como realmente deve ficar. Na cena, percebe-se que ele exerceu sua chefia sem abuso.
Portando, como líderes também precisamos estar atentos ao dia a dia do trabalho de nossos liderados, com a intenção de treinar, corrigir a direção (quando necessário) e interferir, se também for necessário. Um líder não pode ser omisso ao ponto de deixar certos erros passarem, se esses erros são detalhes cruciais. Jobs fez questão de deixar claro que um chefe/líder precisa se preocupar com isso. No contexto, Woz (seu amigo e funcionário) achava que o design, o acabamento de uma simples placa, não era um diferencial. A história prova que um detalhe tão simples como esse, que era determinação de Jobs, se tornou um dos grandes diferenciais daquela que hoje é uma das empresas mais valiosas do mundo.
Nessa cena, Jobs também nos ensina uma lição de razoabilidade. Ele entende a urgência e o prazo apertado, dá razão ao seu liderado e garante que vai procurar ajuda. Isso acontece porque um líder não possui respostas para tudo, infelizmente. Reconhecer isso o ajuda a buscar o melhor para o time, mesmo que esse melhor venha de fora.
Steve Jobs foi um chefe modelador
Vejamos um exemplo:
— Vamos recomeçar tudo do zero. Tem que ser intuitivo, precognitivo. Quero que ele saiba o que você quer fazer antes mesmo de você.
— Ainda estamos falando da barra de comando?
— Bill, estamos falando de tudo, da coisa toda. O Lisa, pessoal, é o futuro, estou dizendo agora. Quer dizer, o Lisa vai fazer, nos próximos 10 anos, o que o Apple II fez nos últimos 3. Eu tenho certeza disso. Sabem por que as pessoas compram um Apple e não um concorrente? Porque ele tem bravata social. Quer saber, ainda mais do que isso, é uma moeda social, nós elevamos o padrão e se quisermos ficar lá em cima temos que arriscar tudo. Grandes artistas …Dylan, Picasso, Newton… se arriscaram ao fracasso e se quisermos ser grandes temos que nos arriscar também.
— Na barra de comando?
— Em tudo!
— Mas…
— E começa com as pequenas coisas.
— Há mais de 20 funções diferentes ligadas a cada variação da barra de comando que, aliás, levam semanas pra ser programadas.
— Não estamos fazendo nada que a IBM não tenha feito. Eu prefiro apostar na nossa concepção a fazer um produto imitação. Temos que tornar as pequenas coisas simplesmente inesquecíveis. Vamos começar com uma coisa simples. Editor do LISA, o que acontece se eu clicar em uma dessas guias?
— Você acessa o menu e depois preferências e opções de páginas.
— Exato, isso mesmo. Agora, em qual guia eu clico para obter Estilos Diferentes de Fonte? Quantos estilos de letra existem no editor de texto do LISA?
— Essa é uma questão que eu queria discutir com você, Steve.
— Eu estou pedindo essas fontes há meses.
— Mas tudo que temos discutido é conceitual e, desculpe, mas estilo de letra não é exatamente uma questão urgente, no momento.
— Tudo é uma questão urgente. Se quisermos que o projeto LISA se transforme em realidade, nós temos que dar o máximo e fazer algo incrível.
— É, mas temos um prazo curto para esse software e, desculpe, mas adicionar fontes bonitinhas não vai mudar isso.
— Se você não compartilha do nosso entusiasmo e interesse pela filosofia dessa empresa.
— Não, é que eu só não to entendendo…
— Saia daqui!
— O quê?
— Pegue suas coisas e saia daqui. Você já era.
— Você vai me demitir?
[Steve Jobs, gritando]: —Não, eu já te demiti! Por que ainda está aqui?
— Steve, ele é o nosso melhor programador na divisão.
— Ele é o melhor programador que não se preocupa com a nossa filosofia.
— Tá bom, eu sei que não cabe a mim dizer isso, mas…
[Steve Jobs, gritando]: — Então cala essa boca, Bill.
[Steve Jobs, gritando]: — Eu quero ver amostras hoje à tarde. De alguma forma, nós conseguimos projetar um processador de texto que não tem Fontes. Isso não pode se repetir.
Jobs era extremamente detalhista, entusiasmado e visionário. São qualidades excelentes para quem as possui. Mas é preciso discernimento e equilíbrio para não projetar essas qualidades nos outros e querer modelar seus liderados. A forma inicial como ele fala até parece ser inspiradora, fazendo referência a grandes artistas da humanidade e reforçando a filosofia da empresa. Ele vende suas ideias de forma dramatizada e até aí estava agindo como líder. Mas depois, Jobs se perde e começa a agir como um chefe abusivo que espera que todos pensem como ele e que não tolera o menor sinal de discordância. A conversa se desenvolve, e é concluída, como uma espécie de lista do que um líder (e mesmo um chefe) jamais deve fazer:
- Não grite com seus funcionários e liderados;
- Não demita ninguém em público;
- Não humilhe ninguém, nem em particular, muito menos em público;
- Saiba ouvir.
Jobs passou rapidamente de líder inspirador para chefe intolerante e rude. E, pior de tudo, não soube recuar. Jobs mostrou-se extremamente despreparado quando o assunto era aplicar princípios de relações humanas.
Steve Jobs foi um líder democrático
Acompanhe o diálogo:
— Estou cansado de salvar sua pele.
— Você adora salvar minha pele.
— Quero minha própria equipe de técnicos.
— Escolha você mesmo!
— E nunca mais vou trabalhar na mira dos seus prazos absolutamente ridículos, eu estou te avisando…
— Você pode até pedir um encontro com ela [apontando para o pôster de uma modelo na parede].
— Eu quero isso também…
Agora agindo como líder, Jobs recua, ao perceber que precisa de um funcionário muito importante para determinado projeto e, democraticamente, estabelece acordos com ele. Steve Jobs usou sua função como chefe para exercer melhor seu papel de líder, usando da autoridade que tinha para liderar, ou seja, tomar decisões.
Portanto, aprendemos que é possível ser chefe e líder ao mesmo tempo.
Steve Jobs foi um líder dirigente
dirigenteadjetivo e substantivo de dois gêneros
que ou quem dirige; governante, gestor, condutor.
Agora observe uma compilação de cenas/frases do filme Jobs (2013):
— É preciso tem um problema que você queira resolver, um erro que você queira corrigir, e tem que ser uma coisa pela qual você seja apaixonado, senão não vai ter perseverança para solucionar.
— Nunca mais quero ouvir você dizer que não podemos deixá-lo mais rápido. Milhões de pessoas vão comprar essa máquina.
— Não podemos olhar para concorrência e dizer que vamos fazer melhor. Temos que olhar para concorrência e dizer que vamos fazer diferente.
— Nós temos a oportunidade de construir uma máquina revolucionária, e na vida podemos fazer apenas algumas coisas. Nesse momento, nós escolhemos fazer isso. Então, que ele seja incrível.
Essas são apenas 4 exemplos de frases, ou momentos, em que Jobs exerceu sua habilidade de conduzir e influenciar pessoas a atingirem resultados. E conduzir pessoas a atingirem resultado é uma das mais notáveis tarefas de um líder. Apesar de ser um chefe abusivo em vários momentos, Steve Jobs também era um líder inspirador e muito amado.
Steve Jobs era um líder afetivo
— Não sei o que estão desenvolvendo, mas quero que esqueçam isso hoje. Eu quero todo mundo projetando algo novo, não importa o que seja, nem que seja tecnologia. Apenas criem alguma coisa, alguma coisa útil, algo importante para vocês mesmo.
Aqui podemos observar o lado mais afetivo de Steve Jobs como chefe e líder, Ele tratou bem o time, mudando o foco par o bem-estar deles.
Conclusão
Podemos aprender muito do exemplo de Jobs, para o bem e para o mal. Isto é, muitos estudam sobre ele já pensando em imitar seus trejeitos de chefe abusivo. Muitos outros querem se inspirar em seu jeito de conduzir as coisas para alcançar resultados excepcionais.
O segredo é entender que Jobs, como qualquer líder, não era perfeito. Analisar suas atitudes, quando mais jovem, podem nos ajudar a escolher se queremos adotar características de um péssimo chefe. Analisar suas atitudes, à medida que ele envelheceu, pode nos ajudar a encontrar o ponto de equilíbrio.
Será que agora podemos responder se Steve Jobs foi um chefe abusivo ou um líder inspirador? O fato é que o objetivo nem era esse. Jobs apresentou, durante décadas de carreira, todos os estilos de liderança possível. Mais que isso, sua vida e carreira provam que um líder está em constante desenvolvimento.
A verdadeira lição que podemos aprender de Steve Jobs é a imitar os bons exemplos que ele deixou, e a não buscar imitar o lado negativo que ele mesmo abandonou à medida que se tornava um líder melhor.
Meu nome é Ninguém. Minha história esqueci. Minha idade é o agora. O passado eu perdi. Eu venho do nunca, eu venho do nada. Não tenho destino, não tenho parada.