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CRÍTICA | Nós (Us), 2019

Novo suspense de Jordan Peele (Corra!) traz importante debate sobre o etnocentrismo americano em mais um longa repleto de acertos
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Jordan Peele se destacou em 2017 com o filme “Corra!”, onde além de dirigir, também escreveu e produziu e fez sucesso nas premiações, recebendo quatro indicações ao Oscar e levando o prêmio de melhor roteiro original. Com isso, os olhos dos amantes de cinema logo se voltaram para ele e seu mais novo trabalho, “Nós”, trazendo mais uma vez o suspense com como forma de abordar uma profunda crítica social, sem deixar de lado o toque de humor característico do diretor.

Ao passar por um trauma de infância que nunca superou em uma casa de espelhos, Adelaide Wilson (Lupita Niong’o), já com seu marido e seus dois filhos, vão passar as férias em uma casa perto da praia. Lá, ela é destinada a retomar as suas lembranças em meio a uma perseguição de pessoas com os mesmos traços físicos de sua família.

Mais uma vez, Peele escreveu, produziu e dirigiu, e não demora para vermos seus traços. Apesar do tom sempre sombrio, o roteiro sempre dá uma quebra com uma boa pitada de comédia na dose certa, em sua maioria advinda do personagem do Winston Duke. Há sempre um tom de mistério no ar que prende bastante o espectador (no meu caso eu já estava criando várias teorias na cabeça), que pode até deixar o filme confuso em diversos momentos, mas no fim somos recompensados com um excelente twist.

O filme tem um bom ritmo, com alguns poucos momentos gratuitos que poderiam ter sido descartados. Também há uma família secundária que não precisava estar no filme, mas já que estavam, poderiam ter recebido um melhor desenvolvimento, pois tudo relacionado a eles acaba sendo caricato. Já os quatro personagens da família protagonista recebem um desenvolvimento muito bom, com personalidades bem definidas e auxiliados por excelentes trabalhos de atuação.

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Lupita Nyong’o é a dona do filme. Ela tem muita expressividade e um olhar que consegue transmitir a sensação que ela desejar. Nela vemos medo, dor, proteção e mistério. É cedo para dizer, mas eu não me surpreenderia se ela conseguisse algumas indicações na temporada de premiações.

Winston Duke é o alívio cômico no longa, mas mais do que isso, ele traz uma crítica a quem vê tudo de forma superficial e se fecha para o que está ao seu redor. É incrível como ele consegue encaixar bem na grande maioria das cenas, mostrando estar bastante confortável no papel. Evan Alex e Shahadi Wright-Joseph fazem os filhos do casal que estão lá não apenas para serem os protegidos, ambos fazem um bom trabalho. Dos coadjuvantes eu destacaria a Elisabeth Moss que mesmo com pouco tempo em cena e uma personagem limitada, ainda consegue elevar um pouco a Mrs. Tyler devido ao seu talento.

A fotografia aqui é bastante inventiva, há um excelente trabalho de luz e sombra e de utilização dos espaços, como em uma cena de perseguição onde a câmera vai girando pela casa para nos ambientar e nos fazer sentir pressionados como os personagens. Talvez alguns reclamem que o filme é escuro demais, e realmente é, mas para sua proposta e pelo que ele tem a dizer, isso não chegou a me incomodar. Também devem ser aplaudidas a maquiagem e a direção de arte.

Outro ponto que auxilia bastante nessa imersão é a espetacular trilha sonora com coral de vozes, violinos, violoncelos e piano. E tudo isso sendo tocado pausadamente, deixando um silêncio constrangedor intercalando a trilha, e em alguns momentos interagindo diretamente com o que acontece em cena.

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O fato de “Nós” ser protagonizado por uma família de negros logo leva a imaginar que o filme aborda a temática racial, como foi “Corra!”, mas não, ele é um exercício de empatia, sobre se unir para se libertar, e traz uma crítica a visão americana (como sugere o título em inglês “Us”, que também é abreviação para “Estados Unidos”) de querer ver o outro como inimigo, quando na verdade o inimigo pode ser a si mesmo.